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O caso Nardoni e o novo fenômeno midiático da classe C


post retirado do site observatório da imprensa

Postado por Carlos Castilho em 27/3/2010 

 Hoje em dia não dá mais para discutir um fato, dado ou fenômeno sem levar em conta o papel da mídia. 
Todo mundo sabe disto, mas a grande dificuldade é identificar onde a mídia interferiu e onde ela não tem uma função decisiva.

A condenação do casal Nardoni é um bom exemplo disto. O julgamento dos acusados foi um espetáculo midiático onde os grandes protagonistas não foram os jornalistas mas o público que ficou do lado de fora e os participantes do juri. Enquanto na fase das investigações, logo após o crime, a imprensa foi determinante na definição de ênfases, no julgamento ela se limitou a armar o palco.

O jogo de cena dos advogados, testemunhas e parentes era natural e faz parte do script. O que surpreendeu foi a reação do público, que acompanhou o julgamento como se estivesse participando de um BBB ou de uma novela. Este envolvimento da platéia é que precisa ser discutido e estudado porque pode embutir algumas surpresas para quem procura fazer uma leitura crítica do que a mídia apresenta.

Observando pela televisão, a maioria das pessoas que se aglomerou em frente ao Fórum de Santana, em São Paulo, para acompanhar o julgamento era formada por pessoas da classe C, muitos dos quais jovens e com predominância de mulheres. A classe C é o grande fenômeno social contemporâneo graças à sua crescente visibilidade por conta do aumento do seu poder de compra.

A classe C é o grande filão de público para a TV aberta porque a população com maior renda já migrou para a TV a cabo ou para a internet. Foi a classe C que esteve na origem do fenômeno midiático dos Nardoni. É bom lembrar que tudo começou quando, há dois anos, a TV Record apostou na cobertura do crime e conseguiu uma empatia imediata da classe C.

Ao perceber o sucesso da concorrente, a Globo entrou pesado no jogo não por interesse jornalístico ou informativo, mas por razões basicamente comerciais. A estratégia era não deixar a audiência da Record disparar porque isto significava perda de pontos no IBOPE e queda do valor do minuto comercial. A Globo não estava tão preocupada com a perda de pontos, mas com o custo da recuperação dos telespectadores perdidos para a concorrente. O custo, segundo os especialistas, é oito vezes maior do que o prejuízo líquido da perda de um ponto.

A partir daí o caso Nardoni se tornou uma estratégia comercial e as regras do jogo da cobertura passaram a ser determinadas por esta opção. Mas o público ficou confuso e não teve a chance identificar o que era da natureza do caso e o que era interesse comercial da mídia, disfarçado de jornalismo.

A lógica de mídia é facilmente identificável, mas o mesmo já não acontece com a identificação das causas que levaram a classe C a se interessar pelo caso. É muito importante estudar este fenômeno porque ele pode estar associado a determinados comportamentos políticos deste segmento social, que tem a tendência a posições radicais, para compensar sua dificuldade em entender situações complexas. Ela não entende porque não lhe dão informações.

A palavra chave na mobilização popular em torno do julgamento foi impunidade. As pessoas não queriam que o casal saísse impune. As razões para este comportamento são várias e seria muito interessante conhecê-las em detalhes para poder entender melhor o perfil comportamental deste segmento social cuja presença midiática é cada vez maior.

O processo de diferenciação de interesses e contextos num caso como o dos Nardoni é complexo porque a mídia é a responsável por 95% das informações recebidas pelas pessoas.  Assim, a mídia escolhe os crimes que vai cobrir e com isto a população é induzida a participar segundo regras e cenários que ela não escolheu, e que na maioria das vezes ela nem consegue distinguir.

A tendência da classe C para posições extremas é muito perigosa em termos políticos porque pode ser facilmente manipulada pela mídia, pelos argumentos citados acima e que são apenas uma tímida tentativa de entender o que está se passando, além das câmeras e microfones.

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